ABA e autismo: o que é, como é feito o tratamento

Sumário

ABA  é a abreviação do inglês Applied Behavior Analysis  que, em português,  refere-se à Análise do Comportamento Aplicado.  Trata-se de uma terapia comportamental utilizada no tratamento do autismo com resultados baseados em evidência

 

A Associação Americana de Psicologia, o Instituto de Psicologia da Universidade de São Paulo (IPUSP) e  muitas outras entidades ligadas à causa do autismo recomendam a ABA.

 

 “ Quando aplicado  com o mínimo de vinte horas semanais durante dois a três anos em crianças de até 4 anos, o ABA garante a reabilitação em 47%  dos casos ” afirma Albertina Marçal, mãe de um autista e coordenadora do  ABCReal, primeiro centro ABA fundado há 15 anos em Portugal.  

 

ABA
A ABA estimula comportamentos funcionais e fortalece as habilidades existentes. Foto Kelly Sikkema/unsplash

O começo de tudo

Na verdade,  a terapia ABA  já é utilizada desde a década de 60, nos Estados Unidos,  mas  começou a ganhar destaque nos anos 80 através do trabalho de Ivar Lovaas. 

 

O  psicólogo e pesquisador é  um dos pioneiros na aplicação da Análise do Comportamento Aplicada em crianças com autismo. 

 

Lovaas publicou, em 1981, um manual de treinamento para pais que se tornou uma referência no assunto.

 

Como funciona o ABA?

A proposta básica da Aba é estimular comportamentos funcionais e fortalecer as habilidades existentes.

 

Além disso, visa modelar aquelas que ainda não foram desenvolvidas de forma que o indivíduo aprenda a interagir com a sociedade.

 

Trata-se de uma ciência com procedimentos claros e replicáveis que compreende sete parâmetros ou dimensões.

 

  1. Aplicadavisa realizar melhorias em comportamentos sociais para aumentar a qualidade de vida das pessoas. 

 

  1. ComportamentalO comportamento deve ser observável e mensurável para que possa ser alterado.

 

  1. Analítica – os dados precisam ser analisados para saber se o procedimento utilizado foi, de fato, responsável pelos resultados alcançados.

 

  1. TecnológicaOs procedimentos são descritos de forma clara e concisa para que outros possam implementá-los com precisão. 

 

  1. ConceitualAs intervenções são consistentes com os princípios demonstrados na literatura e nas pesquisas.

 

  1. Efetiva –  A intervenção é eficaz quando muda o comportamento que procura mudar.

 

  1. GeneralizávelUma mudança comportamental deve ser durável ao longo do tempo e aparecer em uma ampla variedade de ambientes possíveis. 

ABA, tratamento 

 

O tratamento com a Terapia ABA  está estruturado em 4 partes:

 

Avaliação comportamental –   na primeira fase, avalia-se as habilidades cognitivas, motoras e de comunicação.

 

Seleção de metas e objetivos – definição das necessidades a serem trabalhadas.

 

Elaboração de Tratamento –  é como um plano de intervenção. Nesta etapa define-se as metas e objetivos  e as formas de mensuração dos resultados

 

Intervenção – Ação prática através de dinâmicas. As metas são avaliadas frequentemente e as escalas atualizadas.

 

O treinamento de novas habilidades, abarca todos os espaços e  momentos de atividades da criança, o que inclui não apenas o espaço clínico, mas também o ambiente de casa e a  sala de aula. 

 

Por isso, para  alcançar resultados satisfatórios  é indispensável a participação dos pais.  

 

Os pais que utilizam a ABA recebem não apenas assistência como também treinamento para atuarem como Acompanhantes Terapêuticos (AT)

 

Eles adquirem  um conhecimento básico  para aplicar a técnica e casa.

Além disso, é muito recomendável  ter um  trabalho com AT na escola para ajudar a criança a ultrapassar os desafios e adquirir novas habilidades em contexto escolar.

 

Quando iniciar a Terapia ABA?

Quanto mais precoce for início, melhores  serão os resultados.  Neste caso,  evita-se a consolidação de comportamentos indesejados. 

 

Para obter mais benefícios, o  ideal é iniciar a intervenção com a ABA,  antes dos três anos de idade.

 

A idade, leva em conta  a neuroplasticidade, que é a capacidade que o cérebro tem de mudar sua estrutura e funções para se adaptar a novas experiências

Considera- se que os 4 anos de idade sejam a primeira barreira cronológica para o desenvolvimento e aquisição de novas habilidades.  

Porém, mesmo tardiamente há sempre algum benefício com a terapia ABA como relata Albertina Marçal. No caso dos adultos, a terapia pode ajudar a melhorar a autonomia destes.

“Tivemos um jovem de 22 anos que nas primeiras sessões,  precisou ser contido por 4 pessoas.

Cerca de uma ano depois, já conseguia permanecer sentado, uma alteração significativa e que  faz uma enorme  diferença na qualidade de vida de toda a  familia.”

 

Benefícios da ABA

Através da prática, pela repetição do exercício,  dos estímulos, das orientações a ABA promove uma reorganização da comunicação entre os neurônios com os seguintes benefícios:

 

Melhora o desempenho 

Estimula o contato visual

Desenvolve a regulação emocional e sensorial

Melhora  a fala 

Melhora a concentração

Desenvolve atitudes mais pró-sociais

Melhora a qualidade da interação com outras pessoas

Melhora a capacidade de responder ao comando de outras pessoas

 

Uma das principais estratégias da  ABA é  o reforço positivo.  Isso quer dizer que, toda  vez que a criança tem um comportamento positivo,  promove-se um reforço para motivá-la a aprender os comportamentos adequados. 

Este reforço pode ser elogios, abraços, jogos, desenhos, passeios, alimentos ou brinquedos.  Porém, é  necessário oferecer  os reforçadores nos momentos certos, despertem o interesse e causem um efeito na criança.

Além disso, é  importante ressaltar que a ABA  utiliza  técnicas variadas para evitar a estagnação e o tédio da criança. Por isso mesmo, é fundamental ter o apoio de um especialista  para avaliar a criança  e definir qual é a melhor estratégia. 

 

A experiência de quem já fez ABA 

Em 2014, quando descobriu o autismo do filho Mateus com 1,9 meses, a advogada Kaká Lobe, autora do livro “Propósito Azul” e criadora do site Autistólogos, decidiu correr atrás de conhecimento. Foi aí que descobriu a ABA.  

Na época, a indicação para ABA veio do neuropediatra  Erasmo Casella, chefe da Unidade de Neuropediatria do Instituto da Criança da USP. 

Entrevistada por Mirela Carla do podcast AutisPod, ela conta que  a terapia  ABA foi uma revolução no tratamento de Mateus. 

No inicio Kaká, que reside em Blumenau,  ia para São Paulo, com o filho a  cada um mês e meio.  Ela assistia um pouco das as sessões e aprendia com a psicóloga e neurocientista Mayra Gaiato.

Além disso, Kaká aplicava os ensinamentos em casa, uma hora por dia.  A princípio,  ela mesma,  mas depois contratou uma estagiária como assistente terapêutica. 

A ABA, segundo ela, foi um revolução no desenvolvimento do filho. Conforme relata no site Autistologos,  “Após 2 anos de tratamento e 1 ano e 5 meses de aplicação diária do Método ABA, o Matheus recebeu alta de seu neuropeditra e saiu do Espectro Autista!” Além da ABA,  Mateus fazia terapia ocupacional,  sessões com a fonoaudiologo, musicoterapia e natação.

Os resultados obtidos  e o desejo de ajudar outras mães foi o motivo pelo qual decidiu documentar na internet todo o tratamento e a evolução da criança. Hoje  o site Autistologos é uma referencia na área do autismo no Brasil. 

Segundo Kaká, a falta de recurso não pode ser um limitador para as mães ajudarem seus filhos através da Terapia  ABA.  Por isso, ela sugere que as mães aprendam o método e apliquem em casa. 

Para as mães quem tem possibilidades, Kaká também sugere contratar um estagiário para atuar como AT. Pode ser   de fonoaudiologia, de psicologia, pedagogia ou outra  área afim.  Além de oferecer uma oportunidade prática para estudantes da área, com isso as mães também  conseguem otimizar o trabalho e ter mais disponibilidade para estimular a crianças ao longo do dia.

 

Pioneirismo em Portugal

A necessidade de ajudar o filho, hoje com 25 anos e estudando Matemática, foi o que também levou Albertina Marçal a conhecer mais sobre a ABA. Ela e o marido Carlos França viajaram para os EUA para conhecer mais sobre a terapia quando o filho tinha 9 anos.

 

Além da seletividade alimentar, o filho do casal, na época com diagnóstico de Síndrome de Asperger hoje autismo em grau 1, não conseguia dormir sozinho.  Todas as noites, desde os 4 anos, o  menino  vinha para cama dos pais, de madrugada, o que representava o desgaste devido às interrupções de sono de toda a família. Ela conta que com a aplicação técnica o problema resolveu-se em apenas uma sessão feita em casa mesmo pelos treinadores americanos. 

 

“Em relação a seletividade alimentar demorou mais tempo.  Porém, aos  poucos ele passou a experimentar outros alimentos, algo que antes da terapia era impensável”, conta Albertina.  “Na medida em que  ele aceitou  novas experiencias alimentares, também passou a abrir-se mais para o mundo” recorda-se-

Albertina e Carlos ficaram tão entusiasmados com os resultados que decidiram trazer a técnica para Portugal.  Em 2008, fundaram a primeira escola ABA portuguesa que é na verdade uma filial da Escola ABC Real de Sacramento, situada na Califórnia, EUA. 

A instituição oferece cursos e formação,  presenciais e on line para pais, educadores, professores, profissionais de saúde e ação social, além de prestar atendimento individual para crianças, jovens e adultos com Perturbações de Desenvolvimento, Dificuldades de Aprendizagem e Problemas Comportamentais.

 

Casos documentados

Segundo Albertina Marçal,  o  ABCReal tem  documentado tem 14 casos de reabilitação de crianças com autismo,  em Portugal.  Deste,  13  tinham grau moderado e  iniciaram a terapia antes. Um caso era de  autismo leve. 

Porém, segundo ela, isto só possível  se a terapia for aplicada antes dos 4 anos,  com no mínimo 20 horas semanais  de trabalho e  duração de cerca de dois a três anos. 

Sabe-se que  o autismo não tem cura. Todavia,  a reabilitação, especificamente no 14 casos documentados pela entidade, representou a “perda do diagnóstico”  ou seja estas crianças deixaram de ter critérios para diagnóstico de autismo.

 

Referências 

Camargo, Síglia Pimentel Höher, and Mandy Rispoli. “Análise do comportamento aplicada como intervenção para o autismo: definição, características e pressupostos filosóficos.” Revista Educação Especial (2013): 639-650. Disponível em https://periodicos.ufsm.br/index.php/educacaoespecial/article/view/6994

Consulta em: 5/5/2203

Silva, Laysa Sinara Torres da. Contribuições do método aba para o desenvolvimento cognitivo e pedagógico da criança com autismo. BS thesis. Brasil, 2021. Disponível em: https://repository.ufrpe.br/handle/123456789/3797. Consulta em: 5/5/2203

Carla, Mirela. AutisPod. Tratamento de Autismo para crianças, adolescentes e adultos. Kaká do autistologos.  2022. Disponível em:  https://www.youtube.com/watch?v=vi-zD89rY_w&t=2587s. Consulta em 8/05/2023

Lobe, Kaká. Autistologos.  Antes e Depois.  Disponível em: https://www.autistologos.com/antes-e-depois.  Consulta em: 08/05/2023.

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